“Fomento à economia do axé, à cultura e à agroecologia dos povos e comunidades de matriz africana e povos de terreiros” é o objetivo de um edital do Governo Lula. No último dia 3, o ministério da Igualdade Racial e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) destinaram R$ 1,5 milhão para 30 projetos que apresentaram propostas sobre os temas. A previsão é que, ao todo, R$ 4,4 milhões financiem projetos que apoiem a pauta.
“Espiritualidade e religiosidade importam para a saúde. Existe uma ciência que a branquitude eurocêntrica não explica, basta entender as relações de proximidade desses povos com o universo e com os elementos da natureza, com o plantio e a colheita como parte da vida”, afirmou Denise Oliveira e Silva, vice-diretora da Fiocruz Brasília e responsável pela coordenação do edital.
Termos como “saúde” e “ciência” não constam em edital da Fiocruz
O evento para assinatura dos acordos entre o governo Lula e os vencedores do projeto, nesta última terça-feira (3), foi marcado por forte discurso religioso. Ao final da saudação a Ogum e Mãe Gilda, a mãe de santo Jaciara de Oxum liderou um canto do candomblé, pedindo para que todos se levantassem e cantassem. A yalorixá, termo usado para mãe de santo, é sucessora da Mãe Gilda de Ogum, a quem o edital homenageia.
Um dos projetos contemplados busca capacitar 20 mulheres em cursos de costura, velas aromatizadas e doces de santo, usado em celebrações religiosas. O objetivo é apoiar o empreendedorismo feminino em Rio Branco, capital do Acre.
A Fiocruz tem como finalidade desenvolver atividades de pesquisa e tecnologia, especialmente na área de saúde. Apesar disso, termos como “saúde”, “ciência” e “pesquisa” não aparecem no documento para convocar inscrições ao programa. No entanto, o edital segue a mesma linha de uma resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) que recomenda que terreiros sejam integrados ao SUS.
“As manifestações da cultura popular dos povos tradicionais de matriz africana e as Unidades Territoriais Tradicionais de Matriz Africana (…) como equipamentos promotores de saúde e cura complementares do SUS”, afirma a resolução 715, publicada em 2023.
Curiosamente, a resolução do CNS vai quase que na contramão de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia, que proíbe psicólogos de “associar conceitos, métodos e técnicas da ciência psicológica a crenças religiosas”. Conforme aponta o documento, os profissionais de psicologia estão vedados de tratar sobre a dimensão religiosa para melhorar a saúde mental de um paciente.