O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria na última segunda-feira (1º) contra a interpretação de que as Forças Armadas podem exercer um “poder moderador” no país. O julgamento ocorre no plenário virtual e está previsto para terminar na próxima segunda (8). Até o momento, o placar é de 6 votos a zero. A Corte analisa uma ação protocolada pelo PDT em 2020. O partido questionou a utilização do artigo 142 da Constituição para justificar o uso do Exército, da Marinha e da Aeronáutica para interferir no funcionamento das instituições democráticas.
Em junho de 2020, o relator do caso, ministro Luiz Fux, concedeu a liminar para confirmar que o artigo 142 não autoriza intervenção das Forças Armadas nos Três Poderes. Pelo texto do dispositivo, os militares estão sob autoridade do presidente da República e se destinam à defesa da pátria e à garantia dos poderes constitucionais, informou a Agência Brasil.
Até o momento, prevalece o voto de Fux no julgamento. “A missão institucional das Forças Armadas na defesa da pátria, na garantia dos poderes constitucionais e na garantia da lei e da ordem não acomoda o exercício de poder moderador entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”, afirmou o relator.
Acompanharam o entendimento de Fux os ministros Luís Roberto Barroso, André Mendonça, Edson Fachin, Flávio Dino e Gilmar Mendes. Faltam os votos dos ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Dias Toffoli e Nunes Marques.
Dino destaca que não existe um “poder militar” no Brasil
O ministro Flávio Dino ressaltou em seu voto que não existe um “poder militar” no país. “O poder é apenas civil, constituído por três ramos ungidos pela soberania popular, direta ou indiretamente. A tais poderes constitucionais, a função militar é subalterna, como aliás consta do artigo 142 da Carta Magna”, afirmou.
Dino apresentou uma ressalva ao voto do relator, acrescentando a determinação de que, além da Advocacia-Geral da União, a íntegra do acórdão determinado pelo STF sobre o tema deverá ser enviado ao ministro da Defesa, José Múcio, para que “haja a difusão para todas as organizações militares, inclusive Escolas de formação, aperfeiçoamento e similares”.
“A notificação visa expungir desinformações que alcançaram alguns membros das Forças Armadas – com efeitos práticos escassos, mas merecedores de máxima atenção pelo elevado potencial deletério à Pátria. Dúvida não paira de que devem ser eliminadas quaisquer teses que ultrapassem ou fraudem o real sentido do artigo 142 da Constituição Federal, fixado de modo imperativo e inequívoco por este Supremo Tribunal”, destacou Dino.
Gilmar Mendes critica politização das Forças Armadas
O decano do STF, ministro Gilmar Mendes, criticou os “impactos nocivos” da politização das Forças Armadas. Ele disse ver com “perplexidade” que a Corte “esteja obrigada a, na atual quadra histórica, ter de afastar certas pretensões que seriam consideradas esdrúxulas na vasta maioria das democracias constitucionais do planeta”.
“Diante de tudo o que temos observado nesses últimos anos, todavia, faz-se necessária a intervenção do Supremo Tribunal Federal para reafirmar o que deveria ser óbvio: o silogismo de que a nossa Constituição não admite soluções de força”, disse Mendes.
O magistrado apontou que durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL) os militares ocuparam “um sem número de cargos públicos na estrutura do governo federal”. Para o decano, “atividades como a articulação política e a atividade de teor ideológico ou partidário são incompatíveis com o ofício militar”.
Gilmar Mendes também criticou a atuação dos militares na Comissão de Transparência das Eleições instaurada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante as eleições de 2022. O ministro afirmou que as “Forças Armadas buscaram, a todo momento, lançar dúvidas sobre a lisura e a integridade do processo eleitoral”.
“Agiram a reboque de um movimento que buscava descredibilizar o sistema eleitoral de modo a propiciar a consecução de propósitos políticos escusos. Tratou-se de uma operação de assédio à Justiça Eleitoral absolutamente inadmissível e incompatível com a ordem constitucional”, reforçou.
O magistrado acompanhou a ressalva de Dino para que a decisão do STF sobre o tema seja encaminhada às Forças Armadas. “A meu ver, trata-se de medida que, além de apenas aprofundar as conclusões do eminente Relator, se mostra salutar tendo em vista a proliferação, acima descrita, de atos que indicam indevida politização das Forças Armadas”, destacou.