Testemunhas de acusação já ouvidas nos processos contra as pessoas presas pelos atos de 8 de janeiro disseram que os vândalos que invadiram o Palácio do Planalto eram minoria; que muitas pessoas que estavam dentro do prédio rezavam e até mesmo ajudaram a conter a depredação; e que não estavam armados. Entretanto, todos foram presos e acusados pelos mesmos crimes, sem individualização das condutas.

Trechos dos depoimentos de militares da polícia do Distrito Federal e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) foram mostrados em audiência pública nesta quinta-feira, 3, na Câmara dos Deputados, organizada pela Comissão de Segurança Pública.

As pessoas detidas dentro do Planalto ou nas redondezas continuam presas e já foram denunciadas pelos crimes de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e dano qualificado.

A advogada Gabriela Ritter, da Associação dos Familiares e Vítimas de 8 de Janeiro, que apresentou os vídeos, acredita que o depoimento de uma das principais testemunhas de acusação, o major José Eduardo Natale, do GSI, que estava de plantão no Planalto desde às 7h10, afastou a tese de organização criminosa.

No trecho selecionado, Natale afirmou: “As pessoas estavam totalmente descoordenadas, iam para um lado, para o outro, aí se juntavam, rezavam, se separavam; pessoas estavam em choque. Tinham atividades diferentes, motivações diferentes, era bastante heterogêneo [o grupo] que estava ali dentro”, afirmou, na audiência.

“Nem mesmo as testemunhas de acusação podem dizer que existia o crime de associação criminosa, as pessoas estavam sem armas”, comentou Gabriela. “Na bolsa, tinham Bíblia, terço, água, capa de chuva. Armas não tinham. Não foi apreendida nenhuma. Não tinham um líder. Cada um tinha um propósito, um objetivo. Não era um movimento organizado.”

Em seguida, ela apresentou outro trecho, em que Natale afirma que os vândalos eram minoria e que ele recebeu ajuda de alguns manifestantes para evitar danos maiores.

“Os vândalos eram uma minoria. Alguns manifestantes me ajudaram a afastar os vândalos dos locais onde haveria coisas para serem vandalizadas; outros manifestantes ajudaram a debelar riscos de incêndio, a juntar cacos de vidro, coisas assim”, declarou o major do GSI. Mesmo assim, todos receberam voz de prisão e todos foram algemados e presos. “Houve voz de prisão coletiva para todos que estavam dentro do Palácio do Planalto.”

“Como podem todas essas pessoas estarem sendo acusadas da mesma coisa? Foram todos colocados dentro do mesmo bolo, estão presas pelo lugar que elas estavam e não pelo que fizeram”, afirmou Gabriela. “As decisões que mantêm as pessoas presas são praticamente iguais para todos.”

Oficiais da PMDF destacaram perfil pacífico de manifestantes de 8 de janeiro

O tenente Zigler, da Polícia Militar do Distrito Federal, disse que “das manifestações que eu já enfrentei, não era o perfil de pessoas que vêm para confrontar com policiais militares”.

O capitão Erick, também da PMDF, disse que não houve nenhuma resistência por parte das cerca de 200 pessoas colocadas em quatro ônibus no dia 8 de janeiro. Eram três ou quatro policiais por ônibus e “foi suficiente” para garantir a ordem. “Colaboraram perfeitamente.”

Para a advogada, os depoimentos mostram que não há provas dos crimes imputados aos acusados. “Então é isso: associação criminosa armada sem armas de fogo? Não tem como se cogitar de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tomada de poder num domingo de recesso. Não existia essa possibilidade. É a hipótese de crime impossível”, concluiu Gabriela.

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