O Ceará tem uma lista com 44.996 pessoas aguardando por cirurgias eletivas (procedimentos de diferentes complexidades, mas que não são considerados de urgência), conforme informação repassada pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa). Muitas estão nessa fila há anos. A remoção de vesícula, de hérnia inguinal e de útero lideram a relação de espera.

Não há um tempo, oficialmente divulgado, entre a entrada do paciente na fila até a realização da cirurgia, como avalia Gleydson Borges, diretor do Colégio Brasileiro de Cirurgiões no Nordeste. “Existe uma margem de erro grande. O que a gente observa é uma demora de, pelo menos, 2 anos”, acrescenta.

Mas para alguns isso se prolonga por 5 anos ou mais, dependendo da complexidade e da disponibilidade de materiais. Mesmo não tendo o caráter de urgência, a demora para a realização do serviço limita a rotina dos pacientes que passam a conviver com a dor, com a incerteza do atendimento e com os prejuízos psicológicos.

A estudante Naira Nogueira, de 36 anos, conhece bem essa realidade desde 2019, quando recebeu a indicação de artroplastia de quadril, com a necessidade de uma prótese em carência no Ceará, para resolver as dores fortes que sente há cerca de 6 anos. “O médico me disse que eu esperasse 10 anos para fazer a cirurgia. Um total descaso”, lembra.

Em abril deste ano, o Ministério da Saúde aprovou o Plano Estadual de Redução das Filas do Ceará, quando foram estimados 41.105 pacientes no aguardo. Por isso, um aporte de R$ 25,9 milhões foi feito pelo Governo Federal para atender 15.900 pessoas em 12 meses – o restante ficando à cargo do Estado, que não delimitou um prazo para o atendimento.

Apesar dessa divisão, a fila de espera é única e os critérios da lista incluem a ordem cronológica, a gravidade e os casos em que há a intervenção da Justiça para a priorização de pacientes. O Ceará tem 55 unidades efetoras responsáveis pelo agendamento, autorização e realização das cirurgias distribuídas entre os municípios.

“Nós temos uma estimativa de meta de 44.996 cirurgias, o plano estadual tem mais procedimentos cadastrados. Além disso, é responsável pelas cirurgias traumato-ortopédicas mais complexas, que provavelmente também vamos fazer a compra dos insumos”, detalha.

As unidades de saúde, então, vão ampliar de 10% e 15% a realização de cirurgias para reduzir essa espera. Para isso, devem atuar em turnos alternativos e no fim de semana, como é o caso do Hospital Geral de Fortaleza (HGF).

“O HGF, por exemplo, na próxima semana vai iniciar os programas de cirurgias eletivas do plano federal. Nos hospitais do ISGH ainda estamos na pactuação e nos reunindo com os demais para começar a marcar as filas”, adianta Melissa.

A coordenadora analisa as altas demandas e o tempo longo de espera por cirurgias eletivas como um problema mundial e associado ao aumento da expectativa de vida. Nessa realidade, cada país busca uma forma de abreviar o suporte médico à população.

No Ceará, o planejamento e as ações são estruturadas para funcionar numa logística a longo prazo e dar celeridade aos novos casos que surgem. “Essa fila precisa de um gerenciamento, cada instituição está montando um plano e os hospitais têm trazido isso (planejamento)”, conclui.

ANGÚSTIA NA ESPERA

Os sintomas da necrose vascular femoral, uma doença causada pela falta de oxigenação nos ossos e que resulta em dores intensas, começaram em 2017 para Naira Nogueira. “Eu tive uma internação porque acordei totalmente paralisada”, resgata. Foram 3 diagnósticos equivocados até os especialistas descobrirem o problema.

“Eu consegui atendimento pelo Hospital Universitário, em 2019, fiz a consulta e entrei para a fila de espera. Mas o número fazia aumentar”, pondera.

Ainda em 2019, ela estava na posição 419 da fila. Depois, caiu para 452 e esse ano está na linha 382 da relação dos pacientes com a mesma indicação cirúrgica. Os pacientes, como Naira, podem esperar um tempo maior quando entram casos mais graves ou a Justiça determina a priorização de uma pessoa por entender a prioridade.

POR QUE TANTA DEMORA?

Gleydson Borges, também cirurgião atuante no Ceará, avalia as longas filas de cirurgias eletivas como um “problema crônico” no Brasil e intensificado nos últimos anos devido às suspensões dos procedimentos, por períodos de até 4 meses, em 2020 e 2021, devido à pandemia.

“Aqui no Estado essa fila sempre existiu, entretanto, depois da pandemia, houve um represamento pela priorização dos leitos hospitalares dos pacientes com infecção das vias aéreas”, reforça.

As pessoas com indicação de cirurgia para remoção de hérnia, como exemplifica o especialista, apareceram com estrangulamento, que é uma complicação séria. Já aqueles com pedras nos rins, surgem com inflamações mais intensas. Por isso, ele resume: “hoje estamos operando as complicações desses pacientes que ficaram represados”.

O controle disso, como propõe, acontece com a intensificação dos serviços nas unidades públicas e a contração da assistência privada. “Um dos principais modelos é fazer contratualizações de emergência, fazer mutirões de cirurgias e colocar os equipamentos que já existem para funcionar no 3º turno. Com isso, dar vazão à lista de espera”, conclui.

Fonte: DN

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