Em dois anos, o Ceará teve, pelo menos, 23 vereadores cassados pela Justiça Eleitoral devido a comprovação de fraude à cota de gênero nas eleições municipais de 2020. As decisões alteraram a composição das câmaras municipais em, pelo menos, 12 municípios cearenses. Os dados são disponíveis no Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE).
O número, no entanto, pode aumentar. No final de abril, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reformou decisões do TRE-CE, que haviam julgado improcedentes denúncias de candidaturas fictícias nas cidades de Itaiçaba e de Tururu. Os ministros da Corte decidiram pela cassação dos diplomas tanto de eleitos como de suplentes dos partidos Cidadania e PSB, respectivamente.
O julgamento do processo de Itaiçaba ganhou, inclusive, repercussão nacional após embate entre os ministros Kassio Nunes Marques e Cármen Lúcia. Nunes Marques afirmou que é necessário ter “empatia com essas mulheres” e disse não ser fácil “para uma mulher do povo, simples, se candidatar e ter nove votos numa cidade”.
A ministra Cármen Lúcia rebateu e disse não considerar que a discussão sobre fraude à cota de gênero seja uma questão de “empatia” e ressaltou que mulheres não são “coitadas”.
A Justiça Eleitoral tem a tradição de reconhecer como pessoa dotada de autonomia, e não precisar de amparo. Isso é o que nós não queremos, ministro. E eu entendo quando o senhor afirma, de uma forma que soa paternal, dizendo que haja empatia. É preciso, na verdade, que haja educação cívica. (…) Não somos coitadas. Não precisamos de empatia, precisamos de respeito”. CARMÉN LÚCIA – Ministra do TSE e do STF
Como ainda cabe apresentação de mecanismos recursais no próprio Tribunal, a decisão do TSE ainda não foi efetivada e a composição das câmaras municipais de Itaiçaba e Tururu ainda não foram modificadas.
Apesar de não ser explícito, na letra da lei, que o menor percentual é de candidatas mulheres, historicamente os 30% das cotas são destinados à candidaturas femininas – em um reflexo da ainda reduzida representatividade de mulheres na política e do pouco incentivo partidário à participação feminina.
O preenchimento obrigatório da cota de gênero foi imposto em 2006, mas a punição de partidos que apresentem candidaturas fictícias foi endurecida apenas em 2019, quando o TSE decidiu que a presença de candidaturas fictícias levava à cassação de todos os candidatos do partido, porque, mesmo se não tiverem envolvimento na fraude, as demais candidaturas se beneficiaram indevidamente da fraude.
A decisão foi tomada por quatro votos a três, em processo que julgou o caso em coligação para o cargo de vereador na cidade de Valença do Piauí (PI).
No Ceará, no entanto, a primeira cassação por fraude à cota de gênero seria tomada apenas dois anos depois, em maio de 2021, referente à denúncia de candidaturas fictícias na chapa de candidatos do PSD à Câmara Municipal em Croatá. No mesmo mês, a chapa do PDT em Nova Russas também foi cassada.
Em cada uma das cidades, um vereador teve o diploma cassado após a decisão do TRE-CE. Além disso, todos os votos do partido foram anulados e o cálculo do resultado da eleição para vereador de cada município teve que ser refeito. Os novos vereadores de Croatá e Nova Russas tomaram posse em agosto e setembro de 2021, respectivamente.
Até agora, houve a cassação de 23 vereadores em 12 municípios cearenses por conta de fraude à cota de gênero. São eles:
Alto Santo
Capistrano
Croatá
Maranguape
Nova Russas
Pacoti
Potengi
Quixadá
Santana do Acaraú
Santana do Cariri
Senador Pompeu
Sobral