A Organização das Nações Unidas (ONU) pediu ao Brasil a descriminalização do aborto e o veto ao projeto de lei do marco temporal da demarcação das terras indígenas, que foi aprovado no Congresso. O Comitê da ONU para Direitos Econômicos e Sociais citou os temas entre os principais desafios que o país precisa enfrentar para combater as desigualdades sociais.
O informe datado da última sexta-feira, 13, apresentou diversas recomendações ao governo brasileiro. O documento é resultado de uma sabatina na qual o Palácio do Planalto participou há duas semanas em Genebra, na Suíça. Na ocasião, 18 peritos das Nações Unidas perguntaram a uma delegação brasileira sobre os processos de combate à pobreza e implementação de políticas de direitos humanos e sociais.
Além do aborto e do marco temporal, o informe da ONU mencionou mitigação das mudanças climáticas, ampliações de direitos trabalhistas e combate ao preconceito de raça e gênero.
Essas recomendações são para nortear políticas públicas que possam ser implantadas no Brasil, a partir de análises feitas por peritos internacionais e pesquisas sobre direitos humanos e cidadania, segundo a ONU.
Sobre o aborto, o comitê da ONU disse estar “preocupado com os obstáculos que as mulheres enfrentam” para ter acesso ao procedimento. Segundo o documento, mesmo em casos que são assegurados pela legislação brasileira — gravidez de risco, anencefalia do feto e gestação resultante violência sexual —, as mulheres brasileiras sofrem “diversos tipos de discriminação”.
O comitê recomendou que o Brasil reveja a legislação que proíbe o aborto, como forma de deixá-lo “compatível com a integridade e a saúde das mulheres”. Também foi sugerido que o país garanta o acesso ao procedimento de forma segura na rede pública de saúde. O regulamento brasileiro citado pela ONU data de 1940, e estabelece que o aborto provocado pela gestante é crime, com penas de um a três anos de detenção. Quando feito por terceiros, a punição pode chegar a 10 anos de reclusão.
“Garantir a acessibilidade e a disponibilidade de serviços e informações de saúde sexual e reprodutiva adequados e de boa qualidade, inclusive o acesso a serviços de aborto seguro, incluindo também medicamentos para aborto, contracepção e contracepção de emergência, para todas as mulheres e meninas adolescentes no país, especialmente em áreas rurais ou remotas”, recomendou a ONU.
No dia 22 de setembro, a ministra aposentada do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber votou pela descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. O posicionamento ocorreu dias antes de ela deixar a Corte de forma compulsória, ao completar 75 anos de idade.
Depois do voto de Rosa Weber, o ministro Luís Roberto Barroso pediu vista e interrompeu a votação. No último dia 7, o presidente do STF disse que não há uma previsão para a Corte retomar a apreciação do tema. Segundo ele, o aborto “ainda precisa de debate na sociedade”.
Além da discussão no Judiciário, o Congresso possui dez projetos de lei em tramitação que buscam endurecer as penas sobre a prática do aborto. O mais recente é de autoria do deputado Delegado Palumbo (MDB-SP), protocolado na última quarta-feira, 11, que estabelece que a pena para a mulher que faça o procedimento seja de 10 a 30 anos de prisão.
O comitê também recomendou que Lula adote um “mecanismo eficaz” para proteger o direito dos povos indígenas. A ONU salientou que o país precisa agilizar o processo de demarcação de terras e rejeitar a “aplicação e institucionalização” da tese do marco temporal.